Crônicas da (2a.) Gravidez

Grávida aos 40

As angústias de uma gravidez são inúmeras, seja ela a primeira ou a quinta. Cada uma é diferente e traz suas próprias incertezas. Mas se engravidar jovem demais é um problema, estar grávida aos 40 anos é ainda mais constrangedor.
Não temos nenhum órgão do governo ou ONG interessada em nós, ninguém para dar apoio às “mães tardias”, nada de grupos de terapia, nem cursos para reciclagem materna. E as críticas são duras: “ Como você foi deixar isso acontecer?”, “Depois de tanto tempo?!” ou pior “ A essa altura da vida?” e o destruidor: “Você não tem medo de não ter pique para criar essa criança?”
A vida começa aos quarenta, mas não para certas coisas.
Desejo de grávida é uma instituição falida e desmoralizada nessa faixa, nenhum marido se digna a sair de madrugada em busca do morango perdido para atender a futura mãe de seu rebento. Nem tente, eles não serão mais como antigamente. E depois que a psicologia moderna arrancou os desejos das mulheres e ousou estender ou transferir para o futuro pai esse privilégio, é perigoso até ele te mandar sair para buscar uma coisa esdrúxula para ele!
Gravidez aos 40 só é a mesma coisa para a mulher e só emocionalmente falando, porque fisicamente vai exigir bem mais. Lembra que a coluna doía naquela primeira gravidez, pois é, agora vai doer o dobro. O mesmo vale para os pés inchados, as dores nos rins e irritabilidade.
Mas tem o lado bom, você, que já estava começando a pensar que estava velha, que a vida estava acabando, começa a ver que um mundo novo está se abrindo... com fraldas sujas e noites sem dormir, é certo, mas também com sorrisos, com festinhas de Dia das Mães, flores murchas colhidas pelo chão no caminho de volta da escola, histórias antes de dormir e brincadeiras de faz-de-conta. Vale pena!

Privilégios da Grávida

Quando eu soube que estava grávida, dentre os muitos pensamentos que me ocorreram, pensei na comodidade que seria usufruir prioridade nas filas do supermercado e do banco. Durou pouco, no entanto, a minha alegria. Descobri que a fila prioritária das grávidas é compartilhada com deficientes, idosos e mulheres com crianças de colo, um contingente que a faz maior e mais lenta que as filas comuns.
Além disso, gera uma intimidade entre as pessoas (talvez por estarem unidas pela classificação vantajosa) e obriga a uma cortesia mínima para com estranhos que perguntam sobre detalhes íntimos da sua vida, como por exemplo se sua gravidez foi planejada, se é desejada e se o pai da criança vive com você. Essas questões, que em outros círculos seriam evitadas entre desconhecidos, na fila preferencial tornam-se corriqueiras e abrem espaço para que os interrogadores contem também detalhes não inquiridos de suas vidas e despejem conselhos não solicitados.
Parece ser senso comum que ser educado com a grávida é mostrar-se interessado por sua ficha médica: Já teve outros filhos? Como foi a gravidez e o parto anterior? Tem sentido muitos desconfortos? Quais os sintomas mais desagradáveis? O que está fazendo para superá-los?
Uma pergunta infalível do questionário da fila é sobre o sexo do bebê – é menino ou menina? Se você ainda não sabe, prepare-se para a loteria gestacional, que serve para entreter toda a fila e muitas vezes até a operadora de caixa. Se a barriga é arredondada, é menina; se é pontuda, menino. Uns acham que a sua se encaixa no primeiro caso, outros, no segundo. São feitas as apostas, que jamais serão conferidas, uma vez que você provavelmente não verá qualquer daquelas pessoas outra vez. Mas assim o tempo passa e você até acaba achando que a fila andou mais rápido que as outras mesmo. Deve ser esse, o segredo.

A gorda e a magra

O melhor da gravidez é o paparico. E o pior também.
Quando uma mulher se descobre grávida, um mundo de atenções se abre para ela. Tem a preferência à mesa, os horários de sua fome são religiosamente respeitados, pode repetir a sobremesa sem culpa ou constrangimento e ainda é incentivada a comer mais. Se você engorda, porém, todos alertam sobre a dificuldade de perder peso após o parto, sobre os perigos da hipertensão e as conseqüências da má circulação sanguínea.
Todos se acham no direito de dar conselhos sobre alimentação e saúde, dicas que incluem mitos inquestionáveis e lendas que passam de mãe para filha desde que o mundo é mundo.
Você deve comer frutas e verduras, cortar alimentos gordurosos, frituras e molhos, deve tomar muita água e sucos de frutas, recusar refrigerantes e não abusar dos doces, por causa do diabetes gestacional. Mas se ao seguir esses conselhos você emagrece, dizem que está abatida; que não terá forças para o parto; que vai causar desnutrição ao feto; uma anemia grave ou quem sabe até má-formação do cérebro da criança.
Agradar a todos, já se sabe, não é possível. À grávida cabe administrar tudo com classe e ir “empurrando com a barriga” até chegar ao fim o período. Em último caso, uma saída pode ser mentir sobre o peso original, de acordo com a ocasião. Esse foi meu truque que mais deu certo:
Para quem me achava gorda, eu dizia que, ao engravidar, já estava bem acima do peso por isso o excesso agora. Para os que me achavam magra, contestava com números falsos, “engordei uns 10 quilos, não pode ser tudo da criança, não é?” e acrescentava “ que sou muito alta, dá uma falsa impressão”. As baixinhas podem usar esse truque ao contrário, dizendo que estavam magras demais antes e que parecem gordas por serem baixas. E não esqueça, o que importa mesmo é o que diz o obstetra. De preferência consulte um só, para evitar contradições.